Esta planta pertence à família Araceae e cresce às margens de rios, igapós e igarapés amazônicos, sobretudo os de águas brancas (barrentas). Trata-se de uma macrófita aquática anfíbia que possui grande importância na formação das margens de rios e igarapés: é a primeira vegetação que aparece quando há formação de ilhas aluviais. Os frutos da aninga são os alimentos de tartarugas, tracajás, peixes, além de espécies maiores como peixe-boi e búfalo. Contraditoriamente, é tanto venenosa quanto medicinal: o contato direto com sua seiva pode causar queimaduras, mas também pode ser usada como cicatrizante.
Para o povo Makuxi das Guianas,as Araceae fazem parte de um complexo de plantas chamado “Bina” com poderes mágicos, curativos e defensivos, com importância especial no xamanismo e na bruxaria. As pessoas comuns plantam as “binas” nos seus quintais para se defender contra doenças e espíritos malignos. Além disso, os pajés makuxi usam as binas para absorver “dardos” invisíveis, os quais podem usar para se proteger, ou para atacar seus inimigos. A aninga também é considerada uma planta de vingança: uma pessoa enfeitiçada coloca uma gota de seu sangue no talo cortado de aninga, e o feiticeiro começa a sentir coceira no corpo inteiro.
Segundo Amarante et. al (2011), algumas características da aninga são: herbácea com cerca de 4 a 6 metros de altura, limbo foliar medindo de 45 a 66 cm de comprimento e 35 a 63 cm de largura. “Sua inflorescência é uma espádice simples e vistosa de coloração branca amarelada, e sua infrutescência assemelha-se ao abacaxi”, descrevem. Seus frutos têm um alto valor energético, devido à quantidade de carboidratos e são menos ricos em proteínas.
Inspirada nos conhecimentos de povos tradicionais amazônicos que afirmam não haver malária em lugares onde há aninga, a pesquisadora Cristine Bastos do Amarante, da Coordenação de Ciências da Terra e Ecologia do MPEG, desenvolveu um larvicida e repelente com base na planta. Produzido por meio de um composto feito com os óleos essenciais e extratos, o produto se mostrou eficaz contra o mosquito Aedes aegypt, que transmite doenças como dengue, zika e chicungunya. Segundo o material divulgado pelos pesquisadores envolvidos, a ação repelente tem a ver com o alto teor de constituintes voláteis presentes no pecíolo e bainha da espécie.
Por crescer em áreas marginais a rios, a aninga também exerce um papel de retenção de sedimentos e contenção de erosão do solo. Em Belém, na orla da UFPA, Teixeira et. al (2014) demonstraram que as áreas com a presença desta espécie retiveram maior quantidade de sedimentos que as áreas com ausência de ocorrência da aninga. “Na orla da UFPA é perceptível a contenção da erosão com a preservação do solo/barranco quando existe a Aninga”, discutem, o que implica em maior segurança social. Outra informação interessante da pesquisa é que, geralmente, a aninga é uma das espécies que costumam ser podadas para facilitar a visão do rio, o que pode ser prejudicial, considerando sua importância para deter erosões: “É imprescindível que os gestores públicos percebam que o reflorestamento da orla, principalmente no que tange ao uso da Aninga como fator de contenção de sedimentos e de diminuição da força da correnteza e marolas.” (p. 11).
O atributo sensível que distingue a aninga é a hostilidade ao tato: quando há contato direto com sua seiva, ela pode causar cegueira e queimaduras na pele. As araceaes são caracterizadas pela presença de substâncias químicas chamadas “ráfides”, que são compostos por pequenos cristais de oxalato de cálcio, os quais causam inflamação em tecidos especialmente na mucosa, um efeito chamado “efeito agulha.” Nesse sentido, a sabedoria Makuxi reflete a estrutura microscópica das pequenas “agulhas” cristalinas.
AMARANTE, et. al. Caracterização física, química e nutricional dos frutos da Aninga. 2011. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pd/a/Z7rJfPXmF7YbVJcssTPqtPw/?lang=pt
Amorozo, M. C. M.; Gély, A. L. Uso de plantas medicinais por caboclos do Baixo Amazonas. Barcarena, PA, Brasil. B. Museu Paraense Emílio Goeldi, Série Bot., v. 4, n. 1, p. 47-131, 1988. Disponível em: https://repositorio.museu-goeldi.br/handle/mgoeldi/310.
MACUXI. Povos Indígenas no Brasil. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Macuxi
Repelente a base de planta amazônica no combate ao Aedes. Portal do Museu Paraense Emílio Goeldi. 2017. Disponível em: https://www.museu-goeldi.br/noticias/repelente-a-base-de-planta-amazonica-no-combate-ao-aedes .
TEIXEIRA, et. al. Importância da aninga (Montrichardia linifera) na retenção de sedimentos na Baía do Guajará, PA. 2014. Revista de estudos ambientais.