Samaúma

Ceiba pentandra. (Malvaceae)

Considerada a “mãe da floresta”, entre as árvores mais altas, possui raízes muito profundas que trazem água para a superfície mesmo na época seca e cresce em regiões de várzea. A sumaúma pode ter 60 metros de altura e 2 metros de diâmetro. Durante muito tempo, sua classificação a incluía entre os bombacaceas, mas após estudos novos, passou a fazer parte da família das malvaceae, assim como o cupuaçu e o cacau.

Atributos

Muitos povos indígenas afirmam que as grandes sapopemas da sumaúma representam um portal para outro mundo. No Peru, os xamãs misturam a casca da sumaúma, que eles chamam “lupuna”, com ayahuasca para conhecer a “mãe” da planta e receber seus poderes. No Brasil, são muitos os povos indígenas que têm forte ligação com a samaúma sob pontos de vista cosmológicos. 

 

Os Ticuna narram que, no princípio do mundo, uma samaumeira gigante (wotchine) fechava o mundo e por isso não havia claridade. Quando os irmãos Yo’i e Ipi jogaram um caroço de araratucupi (tcha) em sua copa, observaram que uma grande preguiça-real prendia os galhos da samaumeira ao céu. E, ao continuarem jogando caroços, surgiram as estrelas, mas ainda assim não havia claridade no mundo. Tentaram derrubar a árvore com a ajuda de todos os animais da mata, mas não conseguiram, nem mesmo com a ação do pica-pau. Os irmãos decidiram, então, oferecer a irmã Aicüna em casamento para quem conseguisse jogar formigas de fogo nos olhos da preguiça-real que prendia o céu nos galhos da samaúma. Um pequeno quatipuru, taine, conseguiu subir, jogar as formigas e fazer com que a preguiça soltasse o céu. A árvore caiu e assim a luz apareceu no mundo. Do tronco caído, o rio Solimões foi formado e de seus galhos surgiram outros rios e igarapés. 

 

Os Kaxinawá, autodenominados huni kuin, atribuem importante valor às samaúmas. “Yuxin dacixunuan punyan daci we tsaua”, frase traduzida como “todos os yuxin sentaram-se em todos os galhos da samaúma” indica que a árvore é habitada por fortes yuxin (palavra de difícil tradução para o português, mas que pode ser associada à almas, encantados ou espíritos), que fazem parte do mundo espiritual. Por causa disso, essa madeira tem um papel de destaque no Nixpumimá, rito de iniciação de crianças. Dos galhos da samaumeira, chamados de sacupima, são confeccionados bancos para que os meninos sentem, tal qual os yuxin, indicando que após o rito os meninos aprenderão as atribuições masculinas e precisarão aprender a lidar com os yuxin, identificando quem são seus aliados diante dos perigos da floresta. 

 

No Pará, os Gavião Parkatêjê utilizam troncos da sumaúma para as corridas de toras, jogos que compõem ritos importantes em fases de iniciação de novos guerreiros, junto com os jogos de flecha. No Acre, as sumaúmas também aparecem nas cosmologias dos Arara Shawãdawa, sendo parte da narrativa de origem do povo: em uma grande sumaúma vivia um gavião que caçava crianças. A partir da morte desse gavião por um homem, o povo teria surgido a partir de suas penas. 

 

É comum, portanto, que a samaúma, associada a outras espécies animais e em interação com os seres humanos, seja parte de narrativas sagradas, rituais e possua muitos atributos intangíveis.

As fibras ou “painas” do fruto da sumaúma, que lembram fibras de algodão, ajudam a dispersar as sementes, que podem voar para mais de 100 m de distância da árvore mãe. As sumaúmas parecem soltar preferencialmente suas sementes no início da noite, quando os ventos podem levar as sementes mais longe. 

 

Na microscopia, as painas parecem tubos compridos, mas sua composição é muito diferente do algodão. Enquanto o algodão absorve água, as painas da sumaúma não, por isso vários povos indígenas usam nos dardos das suas zarabatanas. Em vez de água, a estrutura celular da paina é muito eficiente em absorver óleo, e existem estudos pesquisando o uso dessas fibras para controlar derrames de petróleo e como veículo para transportar medicamentos no corpo. Os componentes principais da paina são celulose, lignina, polissacarídeos, cera e óleo. 

 

Herre (2020), comenta que a dispersão de sementes pelos ventos nem sempre é a melhor estratégia para árvores de florestas tropicais, cujos dosséis costumam ser fechados, mas a samaumeira subverte essa estratégia. Devido à sua altura, é uma planta emergente, cuja copa consegue ficar acima do dossel, acessando ventos que outras plantas não acessam pelo bloqueio da altura. Dessa forma, as sementes ficam presas às painas e, pelo vento, são dispersadas a distâncias longas da árvore mãe. 


Para a EMBRAPA, a espécie pode ter grande papel em iniciativas de reflorestamento comercial, devido a sua crescente escassez por ser alvo da indústria madeireira e também por apresentar um crescimento satisfatório para diversos usos. Salientam, porém, que ela só deve ser cultivada em solos de alta fertilidade.

Embora a visão possa ser um dos primeiros e mais óbvios sentidos associados a essa espécie vegetal, com suas raízes e comprimentos gigantes, além das flores brancas que chamam a atenção de morcegos para a polinização, enfatizamos aqui a audição e a possibilidade de comunicação proporcionada pelas sapopemas, as raízes da sumaúma.

 

Uma prática comum entre povos indígenas e caboclos é bater nas raízes a fim de produzir sons que se propagam a longas distâncias. A quantidade de água acumulada em seu tronco, somada à estrutura da madeira da sapopema é uma combinação que facilita a propagação do som, o que fez com que no Amazonas a árvore fosse apelidada de “telefone de índio”, assim como é comum dizer que sua barriga ronca. 

 

É comum, também, que essa possibilidade de comunicação também por meio dos sons das raízes também seja atribuída a outros seres não humanos, como os encantados e demais espíritos protetores da floresta. 

 

Benki Piyãko, líder Ashaninka, explica que os sons só podem ser emitidos em duas épocas do ano, que são as mesmas em que se pode extrair o seu leite (seiva). Em suas palavras, “é como se tivesse um estrondo dentro dela”. Conta, também, que uma samaúma consegue abrigar até 500 espécies ao seu redor ou em sua copa. “Todas as coisas que você for tirar dela, você tem que chamar pelo nome dela”, explica. 

 

O sentido auditivo pode ser desperto, também, por outras espécies que vivem nas samaúmas. Em Belém, na Praça Santuário, localizada em frente à Basílica de Nazaré, a samaumeira abriga diversos periquitos que compõem uma paisagem sonora muito característica do bairro.

ARPA- Programa de Áreas Protegidas da Amazônia. O chamado da samaúma. Disponível em: http://arpa.mma.gov.br/o-chamado-da-samau%CC%81ma-2a-edic%CC%A7a%CC%83o-portugue%CC%82s/

 

Agência Museu Goeldi. Uma gigante da floresta no Parque do Goeldi. 2016. Disponível em: https://www.museu-goeldi.br/noticias/uma-gigante-da-floresta-no-parque-do-goeldi 

 

CANAL FUTURA. Um pé de quê? Samaúma. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=CTVm5cowalI 

 

CANTALICE, et. al. A árvore sagrada da Amazônia. In: CHC. 2020. Disponível em: https://www.researchgate.net/profile/Jean-Miranda-2/publication/344580386_A_arvore_sagrada_da_Amazonia/links/5f816b9892851c14bcbc116f/A-arvore-sagrada-da-Amazonia.pdf

 

GLOBO RURAL. Árvores brasileiras: conheça a samaúma. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/2146203/?s=0s 

 

INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Povos Indígenas no Brasil. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/P%C3%A1gina_principal 

 

LAGROU, E. Uma etnografia da cultura kaxinawá: entre a cobra e o Inca. 1991. Disponível em: https://acervo.socioambiental.org/acervo/tesesdissertacoes/uma-etnografia-da-cultura-kaxinawa-entre-cobra-e-o-inca 

 

LEVIS, C. A Árvore-Avó. The New York Times. 2020. Disponível em: https://www.nytimes.com/pt/2020/10/02/opinion/arvores-amazonicas.html 

 

HERRE, A. Flying Trees. Disponível em: https://www.britannica.com/topic/aerial-seed-dispersal-in-rainforests-1673038 

 

RIJA et al. Floss release, seed fall and germination of kapok seeds (Ceiba pentandra) in an urban environment. In: Open Journal of Ecology 3. p. 423-430. 2013. 

 

SOUZA, et al. Sumaúma (Ceiba pentandra (L.) Gaerth). Embrapa. 2005. Disponível em: https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/bitstream/doc/678416/4/Doc41.pdf 

 

TICUNA. O Livro das Árvores. 1998. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me002040.pdf 




Repositórios com estudos sobre Ceiba pentandra

 

1- Repositório Institucional do INPA: https://repositorio.inpa.gov.br/simple-search?query=suma%C3%BAma 

 

2- Portal de Periódicos Capes: https://www-periodicos-capes-gov-br.ezl.periodicos.capes.gov.br/index.php?option=com_pmetabusca&mn=88&smn=88&type=m&metalib=aHR0cHM6Ly9ybnAtcHJpbW8uaG9zdGVkLmV4bGlicmlzZ3JvdXAuY29tL3ByaW1vX2xpYnJhcnkvbGlid2ViL2FjdGlvbi9zZWFyY2guZG8/dmlkPUNBUEVTX1Yx&Itemid=124 

 

3- Repositório Institucional UFPA: http://repositorio.ufpa.br/jspui/simple-search?location=%2F&query=ceiba+pentandra&rpp=10&sort_by=score&order=desc 

 

4- Domínio Público: http://www.dominiopublico.gov.br/search.htm?query=suma%FAma&Botao=Enviar&maxResults=10000&Search= 

 

5- Global Plants: https://plants.jstor.org/search?filter=name&so=ps_group_by_genus_species+asc&Query=ceiba+pentandra 


6- Reflora- Herbário Virtual: http://reflora.jbrj.gov.br/reflora/herbarioVirtual/ConsultaPublicoHVUC/BemVindoConsultaPublicaHVConsultar.do?modoConsulta=LISTAGEM&quantidadeResultado=20&nomeCientifico=Ceiba+pentandra

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