Conhecido, também, como alho da floresta, cipó da mata, ajo sacha, o cipó alho/d’alho é uma liana tropical da família Bignoniaceae. É nativo da América do Sul e está presente em diversas regiões da Amazônia. Seus usos são ornamentais, medicinais e, também, alimentares. Esta trepadeira é considerada, também, uma PANC (planta alimentícia não convencional) e suas folhas, flores e até mesmo a casca são comestíveis. Suas florações se dão várias vezes ao ano e suas raízes são profundas; a planta atinge de 2 a 3 metros.
O povo apiaká, que vive no Mato Grosso e Pará, nas regiões dos rios Juruena e Teles Pires, possui uma cosmovisão sobre as matas que inclui o cipó alho. Para os apiaká, o cipó-alho desorienta o ser humano, fazendo com que passe a andar em círculos e se perca na trilha. Junto com a jiboia e o siruría (um ser antropomórfico que confunde caçadores), estes seres tornam a mata um espaço de mistérios e perigos. (TEMPESTA, 2009).
Em comunidades ribeirinhas em Manacupuru (AM), Vásquez et. al relatam que o cipó-alho é uma das plantas medicinais mais citadas para o tratamento de sintomas de doenças não específicas, como febres e dores de cabeça, por meio de chás e banhos. As autoras destacam o papel das mulheres das comunidades na manutenção dos conhecimentos sobre as plantas medicinais: “Observou-se que o conhecimento das mulheres a respeito das plantas medicinais é amplo, sendo elas as responsáveis pela preparação dos remédios e cuidados com a saúde da família. Já o conhecimento que os homens têm sobre plantas medicinais é menor e está especialmente restrito às espécies na floresta. Segundo Amorozo e Gély (1988), a mulher domina melhor o conhecimento das plantas que crescem próximo às casas, no quintal e no sítio, enquanto o homem conhece mais as plantas do mato”. (VÁSQUEZ et al, 2014). De modo semelhante, um levantamento sobre plantas medicinais cultivadas em comunidades de Igarapé-Miri (PA) apontou o uso do chá de cipó d’alho sendo utilizado para combater gripe, tosse e pressão alta. (PINTO, 2008).
Na Amazônia peruana, o cipó alho é uma das plantas cultivadas para espantar espíritos ruins, junto com a babosa, comigo-ninguém-pode, entre outras. Kawa (2020) pondera que a planta é utilizada para mediar as relações entre humanos e não humanos que convivem no mesmo ambiente, seja auxiliando no afastamento de vibrações ruins, seja contribuindo para a saúde humana: “However, the recognition of such powers or capabilities is not typically interpreted through the language of biochemistry or pharmacology, but rather through Amazonian concepts and idioms linked to the “perspectival” thinking that pervades the region” (KAWA, 2020).
Oliveira (2013) comprovou, através da análise fitoquímica, o potencial antialérgico da planta. Ela explica que, nas alergias, os mastócitos são células que liberam substâncias como a histamina, que são pró-inflamatórias. O cipó alho, assim como outras 4 plantas medicinais analisadas pela autora, tem uma ação inibitória sobre a histamina, que pode ser atribuída aos flavonoides, taninos, catequinas, terpenóides e cumarinas presentes em sua composição.
Pesquisadores da Embrapa do Amapá identificaram indicadores positivos na engorda, crescimento e imunidade de pirarucus quando o extrato do cipó-alho foi incorporado à ração dos peixes. Este extrato é feito a partir das folhas da planta trituradas com equipamentos laboratoriais (que também podem ser maceradas em pilões) e misturadas a álcool.
O cipó recebe esse nome justamente pelo sabor e cheiro parecidos com o alho, servindo, até mesmo, como substituto em preparos de alimentos. Isso se deve às estruturas secretoras da planta, presentes no caule e nas folhas.
Apiaká. Povos Indígenas do Brasil. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Apiak%C3%A1
EMBRAPA. Cipo alho da Amazônia reforça sistema imunológico de alevinos de pirarucus. Disponível em: https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/53493394/cipo-alho-da-amazonia-reforca-sistema-imunologico-de-alevinos-de-pirarucus
KAWA, Nicholas. Plants that Keep the Bad Vibes Away: Boundary Maintenance and Phyto-Communicability in Urban Amazonia. In: Ethnos: A Journal of Anthropology. 2020. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/341811681_Plants_that_Keep_the_Bad_Vibes_Away_Boundary_Maintenance_and_Phyto-Communicability_in_Urban_Amazonia
OLIVEIRA, Déborah. Triagem de cinco espécies de plantas medicinais usadas na Amazônia através da análise de secreção de histamina. Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Neurociências e Biologia Celular da Universidade Federal do Pará. 2013. Disponível em: http://repositorio.ufpa.br/jspui/bitstream/2011/5370/1/Tese_TriagemCincoEspecies.pdf
PINTO, Luciana. Plantas medicinais utilizadas em comunidades do município de Igarapé-Miri, Pará: etnofarmácia do município de Igarapé Miri, Pará. 2008. Tese disponível em: http://repositorio.ufpa.br/jspui/bitstream/2011/1863/1/Dissertacao_PlantasMedicinaisUtilizadas.pdf
TEMPESTA, Giovana. Travessia de banzeiros: Historicidade e organização sociopolítica apiaká. 2009. Tese disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/33534535.pdf
VÁSQUEZ, Silvia. CONHECIMENTO, USO E CONSERVAÇÃO DA DIVERSIDADE VEGETAL EM QUATRO COMUNIDADES RIBEIRINHAS NO MUNICÍPIO MANACAPURU, AMAZONAS. INPA. 2014. Disponível em: https://repositorio.inpa.gov.br/bitstream/1/12802/1/Patr%c3%adcia%20Flores%20V%c3%a1squez.pdf
Referências audiovisuais
Cipó Alho, uma PANC Trepadeira de Flor Comestível (com sabor de alho). Link: https://www.youtube.com/watch?v=NeGnhN2g7Fw
A Flor com Gosto de Alho! Ótima para Imunidade! (Participação Sabrina Jeha) | Nô Figueiredo. Link: https://www.youtube.com/watch?v=TGuWD1eZZoI