Inflorescência pau mulato Fonte- Árvores da UENF
Inflorescência pau mulato Fonte- Árvores da UENF

Pau-mulato

(Calycophyllum spruceanum)

Também conhecido como mulateiro-da-várzea, pau-marfim, mulateiro e escorrega-macaco, o pau mulato é uma espécie nativa da Amazônia, da família Rubiaceae. É uma vegetação típica das várzeas de nossa região. Trata-se de uma árvore com a copa estreita, com cerca de 20 a 30 metros de altura, tronco retilíneo com aproximadamente 40 centímetros de diâmetro, folhas com 9 a 17 centímetros de comprimento. 

Comercialmente, sua madeira é utilizada para a construção de móveis e telhados, além de ter uso paisagístico.

Atributos

Conhecido no Peru como capirona, o pau-mulato é uma das plantas da família Rubiaceae que têm importante papel para os povos indígenas Matsigenka e Campa. Ambos os povos a denominam mesiá, em referência ao seu processo de  troca de casca, ou pele. A árvore simboliza a imortalidade. Os Matsigenka acreditam que, entre o céu e um lugar invisível para nós, corre um rio chamado Meshiaréni, o rio da juventude eterna, abundante em peixes, que também é equiparado à Via Láctea. Este nome deriva justamente da palavra mesiá, pois neste rio os xamãs falecidos e bons espíritos podem trocar de pele, assim como a árvore que descama, permanecendo eternamente jovens e vivos (WEISS, 1975).

 

Embora boa parte dos povos da Amazônia se relacione com as plantas por vias medicinais, ritualísticas e afetivas, essas não são as únicas formas de relação. Entre os indígenas Ticuna, por exemplo, o pau-mulato é um nome importante para a organização social desta nação. A sociedade Ticuna se divide em clãs. São duas metades chamadas exogâmicas, isto é, só se pode casar com membros da outra metade: a “com penas” e a “sem penas”. Essas metades são formadas por um conjunto de clãs identificados com nomes de aves, e a outra metade com nomes de plantas e o pau mulato é um desses sub-clãs. 

 

Entre comunidades ribeirinhas da várzea do rio Solimões, no Amazonas, Cassino (2010) relata que o mulateiro é uma das muitas plantas utilizadas para fins medicinais. Por possuir uma casca lisa e que se renova sempre, é indicado para tratar rugas e para a manutenção da juventude. Esse uso faz parte de um sistema de crenças e concepções sobre a natureza que é chamado de teoria das assinaturas, “segundo a qual os vegetais, animais e minerais possuem as formas da parte do corpo humano que têm a capacidade de curar”. (CASSINO, 2010). Além disso, a decocção (cozimento) da casca é empregada para curar vários sintomas: dores na coluna, problemas de próstata e rins, infecção urinária, inflamações, colesterol alto, problemas da tireoide, entre outros. 

Na Amazônia, o pau-mulato ocorre no Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. A planta tem preferência por solos argilosos e arenosos e pode ser encontrada em praias de várzea e clareiras de matas de solos argilosos. Costuma florescer entre junho e julho e frutificar entre outubro e novembro. 

 

Segundo a Embrapa, o pau-mulato pode ser uma boa espécie para compor Sistemas Agroflorestais (SAFs), pois sua copa pequena e rala facilita a passagem de luz e gera pouca sombra, permitindo que outras plantas recebam sol. Essa é uma característica bem-vinda na combinação de espécies madeireiras com as frutíferas. 

 

Santos et al (2016)., em sua revisão sobre a árvore, apontam que os metabólitos (produtos do metabolismo de uma determinada substância) mais relatados pelos estudos são os taninos e fenóis e ponderam que “parecem ser os responsáveis pelo desempenho da planta no retardo do envelhecimento celular e na fotoproteção por ações antioxidantes (Araújo et al., 2007; Lino et al., 2009). Aos taninos também é creditada a produção de ácido gálico, de cor marrom, que é empregado na indústria de tecido e couro (Emery et al., 2010).”. Esses mecanismos de fotoproteção contra os raios UV funcionam como rejuvenescedores, o que corrobora com a concepção ribeirinha.

Além do atributo visual de seu tronco retilíneo, que muda de cor conforme o processo de amadurecimento da planta, o atributo sensível que destacamos é o tato. Sua textura é lisa, escorregadia, suave ao toque,  o que dá a sensação de tocar algo envernizado. Não à toa, é associado à juventude tanto em cosmologias indígenas quanto na farmacologia ribeirinha. Sua casca é fina e descama anualmente.

CASSINO, Mariana. Estudo etnobotânico de plantas medicinais em comunidades de várzea do rio Solimões, Amazonas e aspectos farmacognósticos de Justicia pectoralis Jacq. forma mutuquinha (Acanthaceae). Dissertação- INPA. 2010. Disponível em: https://bdtd.inpa.gov.br/handle/tede/2046 

Embrapa Amapá desenvolve pesquisas para regeneração natural do pau mulato. 2015. Disponível em: https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/3162581/embrapa-amapa-desenvolve-pesquisas-para-regeneracao-natural-do-pau-mulato

 

SANTOS, A.B. et al. Sobre a botânica, a etnofarmacologia e a química de Calycophyllum spruceanum (Benth.) Hook. f. ex K. Schum. Rev. bras. plantas med. 18 (1 suppl 1). 2016. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbpm/a/qDkDhnnhj85W7ydjrjvMPyR/?lang=pt

 

Ticuna- Povos Indígenas do Brasil. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Ticuna

 

WEISS, Gerald. Campa Cosmology: the world of a forest tribe in South America. Anthropological papers of the AMNH ; v. 52, pt. 5. 1975. Disponível em: https://digitallibrary.amnh.org/handle/2246/278 

 

Audiovisuais:

Um pé de quê? Pau-mulato. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=fudwJ-SJvwE

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